Bastaram poucos minutos para que a internet se encantasse com a doçura e a espontaneidade de Marcello, o “meninim”. O vídeo publicado no Instagram pela mãe, a arquiteta Raquel Cabral, tem todas as razões para justificar as mais de 12 milhões de visualizações. Mas, nenhuma delas é mais apaixonante que o sorriso genuíno — e os olhinhos apertados — do pequeno contador de histórias.
“Era uma vez, uma mãe grávida”, inicia Marcello no vídeo. Ao lado de Raquel, o menino, hoje com 5 anos, conta como a mãe descobriu estar grávida dele, uma criança com síndrome de Down.
A fala dos dois vai muito além do anúncio e das características da criança e, de um modo geral, dos portadores da síndrome. Em um dia qualquer, sem datas comemorativas ou dias mundiais, mãe e filho conquistaram a internet com uma mensagem de amor e acolhimento.
“Vai ser o menino mais amado do planeta Terra. Ele vai ensinar para o mundo que síndrome de Down não tem grau, que não é doença, que não pega, não contagia”, afirmam. “É só uma condição genética e que o diagnóstico não é destino, que só precisa de oportunidade. Se liga, entendeu?”, finaliza Marcello.
VEJA O VÍDEO:
Lugar de acolhimento
O pequeno cearense nasceu cardiopata grave, então, a primeira preocupação da família foi cuidar da saúde do filho. Com 6 meses, ele operou o coração e foram 45 dias de um angustiante pós-operatório. “Quando passou, ele pode de fato começar uma vida normal e eu decidi que queria apresentá-lo para o mundo, não necessariamente a síndrome de Down”, detalha Raquel.
O vídeo que viralizou é um entre muitos conteúdos postados por Rachel e Marcello nas redes sociais. Ali, eles compartilham o dia a dia do menino em casa, na escola, nos passeios e, principalmente, o empenho da família em tornar a criança independente e autônoma. Mas, a mãe pondera: “Quando veem muitos vídeos dele, as mães acham que veio pronto, mas não. Tudo é uma consequência de dedicação, de acreditar, de persistir e insistir”.
De “bebezim” a “meninim”, Marcello cresce à medida que o perfil também ganha novos seguidores. Aos poucos, Raquel percebeu que dialogava com outras mães de crianças portadoras da síndrome. “Percebi que os nossos vídeos traziam esperança para as pessoas que recebiam o diagnóstico”, acrescenta.
Copo meio cheio
A decisão de empoderar Marcello desde muito cedo e nas mínimas atitudes veio depois que Raquel conheceu um adulto com o mesmo diagnóstico do filho. “Essa pessoa me contou que não gostava de ter a síndrome, que se ela pudesse, tirava, e aquilo me marcou demais”, relembra. Foi então que ela decidiu: “Vou fazer com que o Marcello ame ter a síndrome, se orgulhe, que isso vai fazer diferença na vida dele. Muitas vezes sou criticada por exaltar a síndrome, mas é uma característica que vai viver com ele para sempre e é apenas uma entre as inúmeras que ele tem. É só uma condição genética. Explico isso para ele e, apesar de ser pequeno, ele vai se apropriando daquilo”, afirma.
O diagnóstico de Marcello veio ainda na gravidez. A arquiteta conta que já havia passado por três abortos e que, quando engravidou do menino, o que não estava programado, a única preocupação era se o coração dele estava batendo.
“Recebi a notícia muito bem e acho que isso foi muito positivo para ele, se sentiu desejado e muito amado. Talvez seja uma característica minha ver o copo meio cheio”, comenta.
Nada convencional
Nessa missão de desmistificar a convivência com um portador da síndrome de Down, Raquel foge de denominações como: cromossomo do amor, anjos, mãe guerreira, portador de necessidade especial. “São formas bonitinhas de falar, então não é sobre isso. Quanto mais a gente fala com naturalidade, mais a gente mostra e expõe e isso tudo vai se desmistificando. Não gosto de ser aquela que está corrigindo todo mundo, gosto de mostrar com leveza, com vídeos felizes, descontraídos. É a gente de verdade”, explica.
Dono de uma personalidade forte, Marcello sabe o que quer. “E diz pérolas surreais. Tem uma memória fantástica e aprende com facilidade. Temos até que ter cuidado com o que falamos perto dele. Às vezes, ele me coloca em situações que não acredito (risos). Somos uma família normal”, descreve.
Apesar da normalidade, Raquel sempre se viu como uma mãe nada convencional, como gosta de destacar. Casada com o engenheiro civil Achilles Barreto, ela também é mãe de Bernardo, de 13 anos, fruto de adoção, e de Maria Alice,de 10, fruto de outra relação do engenheiro.
“Sou uma mãe para cada filho. Ser mãe do Marcello é desacelerar”, comenta a arquiteta emocionada. “É aprender a persistir, a acreditar, a valorizar os mínimos detalhes. É um olhar mais atento, um olhar mais inclusivo. Como mãe do Marcello, meus olhos se abriram demais para o mundo. Me mostrou um sentido de mundo muito diferente do que eu tinha antes. Sou uma pessoa muito melhor. Sou uma capacitista em desconstrução, toda hora observando cada fala, cada olhar meu para o mundo”.