A prisão da juíza Hannah Dugan, em Wisconsin, nos EUA, na semana passada, por supostamente impedir a detenção de um imigrante, marca um ponto de virada na política norte-americana: ao tornar a magistrada alvo de retaliações, o presidente Donald Trump investe diretamente contra a independência do Poder Judiciário – agora, sem vergonha de deixar transparecer seu projeto autoritário.
Desde o início do segundo mandato, Trump intensificou ataques a juízes que barraram suas ordens executivas, especialmente nas áreas de imigração e direitos civis. A retórica presidencial, que inclui ameaças de impeachment e deslegitimação pública, é acompanhada de ações que desrespeitam decisões judiciais, como o uso do Alien Enemies Act para deportações sumárias, em ofensa ao devido processo legal.
Antes disso, a administração Trump lançara decretos para determinar à procuradora-geral dos EUA (DOJ), Pamela Bondi, que buscasse sanções contra escritórios de advocacia que teriam se envolvido em litígios “frívolos, irracionais e vexatórios” contra os EUA. Trata-se de uma tentativa escancarada de intimidar os profissionais do Direito – e, mais do que isso, de minar os freios e contrapesos da república.
A iniciativa de Trump tem uma intencionalidade clara: evitar que se repita nos EUA o que sucedeu em outras partes do globo, em que aventuras ditatoriais foram barradas pelo Poder Judiciário, como é o caso do Brasil. Aqui, o STF, não obstante alguns exageros, impediu a intentona golpista que buscava reeditar o trevoso período militar.
Trump conhece bem a situação do Brasil, não apenas pela proximidade com a família Bolsonaro, que manipula sem dificuldade, conforme a conveniência, mas também por se envolver em uma briga com o ministro Alexandre de Moraes – processado nos EUA por uma de suas empresas.
O presidente norte-americano tem a certeza de que o regime democrático só não sucumbiu no Brasil porque, entre outros motivos, há juízes em Brasília. Daí a sua pretensão de calar, na América do Norte, toda e qualquer caneta que se levante contra seus desígnios.
Na realidade, democracias podem até sobreviver a presidentes com vocações despóticas, todavia, não duram muito quando seus juízes estão atados por interesses políticos e econômicos. A história demonstra que não há Estado de Direito possível onde os tribunais se ajoelham – e é exatamente isso que Trump tenta impor, com métodos cada vez mais explícitos.