As cúpulas do Judiciário e do Legislativo reagiram nesta segunda-feira, 8, às críticas feitas pelo bilionário Elon Musk, dono do X (antigo Twitter), à atuação do Supremo Tribunal Federal (STF). O presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, afirmou ontem que o “inconformismo contra a democracia se manifesta na instrumentalização criminosa das redes sociais”.
Já o presidente do Senado e do Congresso, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), disse que a regulamentação das redes é “inevitável”. A Polícia Federal vai investigar se Musk cometeu algum crime ao ameaçar descumprir decisão do Supremo.
A investida de Musk se deu contra decisões do ministro Alexandre de Moraes, que é também presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Moraes, em resposta, incluiu o empresário no inquérito sobre milícias digitais, anteontem, após o bilionário ameaçar descumprir decisões que determinaram a retirada de conteúdos do X.
A PF, a pedido de Moraes, vai analisar se as declarações do empresário podem ser enquadradas, por exemplo, como apologia de crime. A PF também monitora os desdobramentos do caso.
Musk prometeu publicar decisões judiciais que determinaram o bloqueio de perfis no X, alegando que elas promovem censura, mas há ordens em sigilo. Uma eventual divulgação pode ser interpretada pelos investigadores como vazamento indevido.
A reação em série ocorreu depois de um post de Musk em que se dizia inconformado com a retirada de conteúdo e com o bloqueio de perfis investigados por ataques às urnas eletrônicas. Musk chegou a afirmar que iria remover as restrições ordenadas por Moraes. E disse que o ministro viola a legislação brasileira e profere exigências “draconianas”.
VPN
Em uma publicação, ensinou ainda seus seguidores a acessar a plataforma X por meio do programa Virtual Private Network (VPN), o que, na prática, significa orientar como se manter no X, mesmo se ele, eventualmente, estiver bloqueado no País.
Além da repercussão institucional, o episódio alimentou o cenário de polarização política no País. O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) afirmou que o assunto “está palpitando fora do Brasil”. “Parece que a salvação nossa, a democracia, está ameaçada”, disse, em uma Live.
Barroso, que preside o Judiciário, reforçou que a Corte máxima vai seguir atuando na proteção das instituições e destacou que “toda e qualquer empresa” que opere no País está sujeita à Constituição Federal, às leis e às decisões da Justiça brasileira. “Decisões judiciais podem ser objeto de recursos, mas jamais de descumprimento deliberado. Essa é uma regra mundial do estado de direito e que faremos prevalecer no Brasil”, ressaltou.
O ministro Edson Fachin também se pronunciou. “Nenhum CEO pode dizer que não vai cumprir decisão judicial.”
Integrantes do primeiro escalão do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva defenderam o controle das redes sociais, em diversas manifestações. O ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, classificou o episódio de “ataque inadmissível”.
O advogado-geral da União, Jorge Messias, defendeu a regulamentação das redes: “Não podemos conviver em uma sociedade em que bilionários com domicílio no exterior tenham controle de redes sociais e se coloquem em condições de violar o estado de direito”, escreveu Messias na mesma rede controlada por Musk.
O relator do Projeto de Lei 2630, das fake news, deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), disse que pedirá ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), para incluir a proposta novamente na pauta.
Marco legal
Pacheco cobrou a votação do projeto já aprovado no Senado e em tramitação na Câmara que visa estabelecer um marco legal sobre o assunto no Brasil. A proposta foi votada no Senado em 2020 e aguarda a apreciação pelos deputados federais.
“Não é censura, não é limitação da liberdade de expressão. São regras para uso dessas plataformas digitais para que pessoas não disseminem ódio, violência, ataques a instituições”, afirmou, em entrevista ontem. “A participação do Judiciário tendo que decidir sobre essas questões sem que haja uma lei que discipline acaba gerando controvérsias como essas que vimos, de o Judiciário precisar agir”, reforçou.
Neste domingo, 7, Moraes também havia ordenado a abertura de um inquérito à parte sobre o empresário por suposta obstrução da Justiça, “inclusive em organização criminosa e incitação ao crime”.
A avaliação de Moraes é a de que o bilionário “iniciou uma campanha de desinformação sobre a atuação” do Supremo e do TSE, “instigando a desobediência e obstrução da Justiça, inclusive em relação a organizações criminosas, ordens emanadas da Justiça brasileira relacionadas ao bloqueio de perfis criminosos e que espalham notícias fraudulentas, em investigação nesta Suprema Corte”.
‘Apoio externo’
Bolsonaro, na transmissão realizada na noite de domingo, afirmou que a fala de Musk deixou claro um “apoio fora do Brasil”. Declarou, ainda, que a “liberdade de expressão está ameaçada”.
Ele estava ao lado de dois de seus filhos: o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e o vereador Carlos Bolsonaro (PL-RJ).
Apoio independe de filiação política?, questiona empresário
Musk disse na segunda-feira, no X, que sua rede social apoia o povo do Brasil “independentemente de filiação política” e questionou se Alexandre de Moraes faz o mesmo.
Mesmo que Musk recue e cumpra determinações da Justiça brasileira, bolsonaristas que tiveram as contas restritas nas redes sociais têm se valido de meios para burlar o bloqueio das contas, não só no X. O blogueiro Allan dos Santos criou, na sexta-feira, o 40.º perfil no Instagram, após a 39.ª conta, aberta quatro dias antes, ser derrubada pela plataforma.
Ele também tentou driblar a decisão de Moraes ao criar uma conta na rede social OnlyFans, de conteúdo adulto, em março. O perfil foi suspenso. No domingo, conseguiu fazer uma live, mesmo com a conta do canal Terça Livre no X – suspensa no Brasil. O blogueiro mora nos EUA e está foragido da Justiça brasileira.
Um grupo de parlamentares e líderes da direita lançou um manifesto em apoio a Musk. Online, o manifesto se chama “Censura Não – o Brasil precisa ter voz”.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.