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Lava Jato volta aos holofotes após tentativa de sepultar operação anticorrupção

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A anulação de provas nos processos da Lava Jato – imposta pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Dias Toffoli – foi comemorada pelo PT e por aliados de Lula como se fosse a pá de cal sobre a operação que investigou desvios bilionários na Petrobras durante as gestões presidenciais petistas. Em setembro de 2023, o ministro do STF afirmou que a prisão de Lula foi um “erro judiciário” e abriu o caminho para anulação de processos, entre eles, as acusações contra o empresário Marcelo Odebrecht e contra o ex-ministro Antonio Palocci.

Enquanto o Supremo “desmontava” os processos da Lava Jato, o ex-juiz Sergio Moro, hoje senador paranaense pelo União Brasil, e o ex-procurador da República Deltan Dallagnol (Novo-PR) passaram a ser investigados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). No ano passado, o relatório final do processo de correição apresentou “hipóteses criminais” por peculato e desvios de dinheiro público com o suposto envolvimento de Moro e Dallagnol, além de outros integrantes da força-tarefa.

Apesar da campanha de descredibilização contra a Lava Jato, iniciada há mais de 10 anos na 13ª Vara Federal de Curitiba, os processos da operação voltaram aos holofotes com a prisão do ex-presidente Fernando Collor e do asilo político da ex-primeira-dama do Peru Nadine Heredia, esposa do ex-presidente Ollanta Humala, que foi recebida por Lula após a condenação do casal a 15 anos de prisão por lavagem de dinheiro pelo financiamento ilegal nas campanhas de 2006 e 2011. A suspeita é que a última eleição teria sido financiada pela Odebrecht. 

O ex-presidente Collor teve a prisão decretada pelo ministro Alexandre de Moraes na semana passada e cumpre a pena em regime domiciliar. Em maio de 2023, o STF condenou o “caçador de marajás” a 8 anos e 10 meses de prisão pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A investigação apontou que o ex-presidente da República recebeu R$ 20 milhões para viabilizar irregularmente contratos da BR Distribuidora, antiga subsidiária da Petrobras, com a UTC Engenharia para a construção de bases de distribuição de combustíveis, entre 2010 e 2014.

Busca em escritório de Youssef durante a Lava Jato localizou depósitos para Collor 

Os casos envolvendo Fernando Collor e o casal presidencial peruano tiveram origem na operação paranaense e são citados pelos lavajatistas como exemplos de combate à corrupção e à impunidade, depois da reversão de sentenças judiciais em favor dos suspeitos de participação do esquema do Petrolão.

Em entrevista à Gazeta do Povo, Moro lembra que autorizou a busca e apreensão no escritório do doleiro Alberto Youssef durante a condução dos trabalhos na 13ª Vara Federal de Curitiba, que culminou na localização dos depósitos bancários feitos pelo operador do esquema ao ex-presidente Collor. À época, o material apreendido apresentava oito depósitos fracionados com valores entre R$ 1,5 mil a R$ 9 mil, efetuados nos dias 2 e 3 de maio de 2013.

Como Collor ocupava a cadeira de senador e tinha foro privilegiado, o caso foi remetido ao STF. “Toda a investigação começou em Curitiba e houve muitos mais atos investigatórios no STF, mas é evidente que se trata de um desdobramento da Lava Jato. O Supremo demorou, mas condenou. Houve a tentativa de rever a pena, o que não aconteceu, mas entendo que a prisão domiciliar é muito questionável”, afirma.

Moro defende o legado da Lava Jato e diz que a operação mostrou que é possível combater a corrupção com medidas de prevenção e repreensão. “É preciso diminuir as oportunidades e aumentar os riscos tanto de ser descoberto quanto de ser punido. Nós fizemos a lição de casa e contribuímos com investigações de outros países, como o Peru, que teve quatro ex-presidentes implicados em subornos recebidos, principalmente da Odebrecht.”

O senador da oposição também critica o governo Lula por abrigar a ex-primeira-dama do Peru Nadine Heredia após a condenação no país andino. “A Justiça peruana funcionou e condenou o ex-presidente Ollanta Humala por corrupção e lavagem de dinheiro. Contraditoriamente, o Brasil oferece asilo político à condenada por corrupção, sendo que o asilo é para alguém que sofre alguma perseguição política, o que não é o caso no Peru”, compara Moro.

Na avaliação dele, o atual cenário confirma que a anulação dos processos da Lava Jato teve motivação política. Moro reiterou que o escândalo dos desvios das aposentadorias no INSS reforça a necessidade de aprimoramento do combate à corrupção no país com a punição dos responsáveis. A denúncia da fraude derrubou o ministro da Previdência Social, Carlos Lupi.

“A Justiça peruana condenou o ex-presidente Ollanta Humala. Contraditoriamente, o Brasil oferece asilo político à condenada por corrupção, sendo que o asilo é para quem sofre perseguição política, o que não é o caso.Senador Sergio Moro (União-PR)

Moro pontua que a anulação de condenações feitas pelo Supremo, em particular por alguns ministros, é injustificável. “O que temos na Lava Jato é uma reviravolta política com anulações sem base jurídica que reforçam a impunidade. Nesse cenário, surge o escândalo do INSS […] Eles se sentiram à vontade para cometer essa megafraude contra aposentados e pensionistas com a percepção de que nada irá acontecer”, avalia o ex-juiz.

Prisão de Collor derruba narrativa de perseguição ao PT na Lava Jato

Para o cientista político e professor do Insper Leandro Consentino, a prisão do ex-presidente da República Fernando Collor contraria a tese petista de perseguição política durante a operação Lava Jato, que chegou a prender Lula em abril de 2018. “Isso abala a narrativa de que a operação foi toda montada para atacar o Partido dos Trabalhadores. Se ainda temos algumas pontas soltas da Lava Jato com condenações fora da esquerda, isso desmonta a narrativa do PT quando a operação também atinge adversários”, reforça.

Consentino avalia que a Lava Jato ainda pode produzir resultados residuais com a tramitação dos processos, no entanto, sem o mesmo impacto no cenário nacional. “Temos o tempo político e o jurídico. Estamos assistindo ao processamento dessas decisões em um tempo bem diferente do que foi o ápice da Lava Jato. As coisas já se arrefeceram na esfera política, mas do ponto de vista jurídico continua produzindo efeitos disseminados pelos espectros ideológicos. Tanto aliados quanto adversários da esquerda são atingidos pela operação.”

Questionado sobre a decisão do governo Lula em abrigar a ex-primeira-dama peruana, Consentino diz que o episódio reforça o discurso da oposição contra a “ideologização da política externa brasileira” durante a gestão presidencial petista.

Deltan Dallagnol compara caso de Collor no STF com presos do 8 de janeiro  

O ex-procurador e ex-deputado federal Deltan Dallagnol criticou a prisão domiciliar de Collor, que cumpre a pena em uma cobertura em Macéio (AL). O apartamento na orla da capital alagoana está avaliado em R$ 9 milhões.

“A decisão foi de Alexandre de Moraes, que atendeu ao pedido da PGR com a justificativa de idade avançada e problemas de saúde. Estamos falando de um réu condenado por corrupção e lavagem de R$ 20 milhões — que só foi preso depois de mais de 10 anos de processo”, publicou Dallagnol.

Ele compara o caso de Collor com o processo da cabeleireira Débora Rodrigues, que pode ser condenada a 14 anos de prisão pela Primeira Turma do STF por ter pichado com batom a frase “perdeu, mané” na estátua da Justiça em frente ao prédio do Supremo, em Brasília, no dia 8 de janeiro de 2023.

“O processo do primeiro [Collor] demorou, levou 10 anos, foi respondido com ele solto e a condenação foi de 8 anos e 10 meses de prisão. O segundo processo voou, demorou um ano a condenação, ela respondeu presa durante dois anos e tem uma pena de 14 anos. Qual o crime mais grave? Qual a pessoa mais perigosa?”, questiona o ex-procurador.

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