Mais de 80 intelectuais e professores de diversas instituições acadêmicas, como Stanford, Princeton e MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts), assinaram uma carta aberta contra o bloqueio do X (ex-Twitter) no Brasil, determinado pelo ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal). Os signatários afirmam que “apoiar o controle estatal do discurso público por meio da censura de oponentes políticos deveria ser inadmissível para qualquer defensor da democracia”.
O documento, intitulado “Contra a Censura e Seus Defensores Acadêmicos”, foi divulgado nesta 5ª feira (26.set.2024), em resposta à carta de 17 de setembro feita por intelectuais de esquerda em apoio ao bloqueio da rede social do empresário Elon Musk. Eis a íntegra (PDF – 62 kB).
“Em vez de apoiar o X, a lei e a liberdade de expressão dos brasileiros, a carta dos acadêmicos condena Elon Musk por oferecer a única plataforma digital no Brasil que se recusou a censurar discursos considerados indesejáveis por alguns servidores públicos. Parece que os signatários acreditam que os governos deveriam decidir o que seus cidadãos podem ou não ouvir, e usar todo seu poder para silenciar críticas —essencialmente apoiando o autoritarismo”, diz trecho da carta.
Ao Poder360, o professor de economia na Universidade de Iowa (EUA) Luciano de Castro, que participou da iniciativa, afirmou que há um sentimento generalizado de “guerra à liberdade de expressão em várias partes do mundo”.
Segundo o acadêmico, esse foi o ponto crucial para que ele e colegas assinassem a carta.
“Acho que é difícil não reconhecer que há essa guerra, e que é promovida, em grande parte, pela esquerda”, declarou.
Leia lista de intelectuais que assinam carta contra bloqueio do X
Leia a íntegra da carta:
“Ninguém deveria valorizar mais a livre troca de ideias do que os acadêmicos, cuja principal finalidade é desenvolver, desafiar e aprimorar ideias. Apoiar o controle estatal do discurso público por meio da censura de oponentes políticos deveria ser inadmissível para qualquer defensor da democracia. Assim, ficamos desapontados com a carta pública “Contra o Ataque das Big Techs à Soberania Digital, assinada por muitos acadêmicos notáveis, incluindo Daron Acemoglu e Thomas Piketty.
“Embora a carta mencione “Big Techs” em geral, ela destaca o X, de Elon Musk, como um “exemplo de um esforço mais amplo para restringir” a “agenda de desenvolvimento digital” do Brasil (e de outras nações). Tentamos entender o que isso significa, mas, antes, vale a pena revisar os fatos.
“A lei brasileira estabelece que qualquer ordem judicial para remover conteúdo de uma plataforma social deve especificar qual conteúdo deve ser removido (Lei 12.965, Art. 19, §1). A lei também afirma a proteção constitucional à liberdade de expressão (Art. 5, IV, IX e Art. 220 §2). No entanto, o ministro Alexandre de Moraes ordenou a suspensão das contas de influenciadores, jornalistas e até de membros do Congresso, todos críticos do atual presidente. O X acatou essas ordens até abril de 2024, quando Elon Musk afirmou que isso violaria as leis no Brasil. As ameaças de Moraes de multas e prisão do representante legal do X levaram a empresa a fechar seu escritório no Brasil. Moraes ordenou a suspensão do X para todos os brasileiros, juntamente com a apreensão dos ativos da Starlink para cobrir as multas impostas. Note que a Starlink é uma empresa separada, sem conexão com o X além do fato de que Elon Musk é acionista em ambas. Um relatório do Congresso dos EUA constatou que “Moraes ordenou a censura de um cidadão brasileiro por criticar Moraes por censurar brasileiros” (p. 5).
“No entanto, em vez de apoiar o X, a lei e a liberdade de expressão dos brasileiros, a carta dos acadêmicos condena Elon Musk por oferecer a única plataforma digital no Brasil que se recusou a censurar discursos considerados indesejáveis por alguns servidores públicos. Parece que os signatários acreditam que os governos deveriam decidir o que seus cidadãos podem ou não ouvir, e usar todo seu poder para silenciar críticas —essencialmente apoiando o autoritarismo.
“A carta retrata o X como se de alguma forma controlasse o fluxo de informações no Brasil, em vez de ser apenas uma das muitas plataformas pelas quais os brasileiros acessam informações. Ela também vincula o X à incitação aos atos de 8 de janeiro de 2023 e sugere que sua suspensão é motivada por sua recusa em bloquear contas envolvidas nessa instigação. No entanto, como mencionado anteriormente, o X não se recusou a cumprir nenhuma ordem antes de abril de 2024.
“Introduzindo o conceito pouco familiar de “soberania digital”, a carta exige que as “Big Techs parem suas tentativas de sabotar” a “agenda digital” do Brasil, que eles incetivam o governo a implementar. Não está claro qual é essa agenda, mas parece ser uma repetição de velhas ideias de política industrial, que geralmente criam ineficiências e perdas para empresas e consumidores, enquanto geram lucros significativos para empresários bem conectados. Mesmo que esse resultado não se concretize, há um perigo maior hoje: a possibilidade de o governo conseguir silenciar a oposição, abrindo caminho para um regime autoritário.
“Em um ponto, no entanto, devemos admitir algum acordo com os signatários da carta: há, de fato, um perigo de que as empresas de Big Tech possam cooperar para minar a democracia. Na verdade, muitas delas parecem estar trabalhando com governos para suprimir pontos de vista que consideram indesejáveis. O Brasil serve como um exemplo notável, mas dinâmicas semelhantes foram observadas nos EUA também, com muitas figuras públicas expressando apoio ao controle da fala. A única plataforma que tentou resistir a essa pressão e defender a liberdade de expressão foi o X. O mundo deve gratidão a Elon Musk por salvaguardar esse direito fundamental e manter o X como um espaço onde todas as vozes podem ser ouvidas. Ao fazer isso, ele está na verdade protegendo a democracia — até mesmo daqueles acadêmicos que parecem indiferentes ao autoritarismo, desde que ele esteja alinhado com sua ideologia política preferida.
“Em resumo, defendemos a liberdade de expressão e estamos comprometidos em manter um mercado livre de ideias onde a troca de pensamentos não é suprimida, independentemente de serem considerados indesejáveis por alguns. Apenas o debate vigoroso sobre todas as ideias pode levar a julgamentos informados e, consequentemente, ao verdadeiro progresso”.
BLOQUEIO DO X
A rede social está suspensa no Brasil desde 30 de agosto por determinação do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes referendada pela 1ª Turma do Supremo. O bloqueio do X se deu em razão do descumprimento de ordens judiciais, como o bloqueio de perfis, o fornecimento de informações sobre monetização e a falta de um representante legal no país.
Nesta 5ª feira (26.set), o X atendeu a decisão magistrado para que comprovasse a regularidade de seu representante legal. Agora, a empresa pede o fim da suspensão da rede social no Brasil.