Em depoimento à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do 8 de Janeiro, Walter Delgatti, conhecido como hacker da “Vaza Jato”, acusou o ex-presidente Jair Bolsonaro de lhe pedir que assumisse a autoria de um “grampo” no ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
Conforme Delgatti, em 2022, durante uma conversa com Bolsonaro por telefone, o então presidente disse que “organizações internacionais” conseguiram “grampear” o ministro.publicidade
“Segundo Bolsonaro, eles haviam conseguido um grampo, que era tão esperado à época, do ministro Alexandre de Moraes”, afirmou o hacker. “Que teria conversas comprometedoras do ministro, e ele precisava que eu assumisse a autoria desse grampo”.
À CPMI, o hacker disse se encontrou com Bolsonaro. De acordo com Delgatti, durante um café da manhã realizado no Palácio da Alvorada no ano passado, o então presidente da República teria questionado sobre a possibilidade de invadir o sistema das urnas eletrônicas no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
De acordo com o hacker, o encontro com Bolsonaro ocorreu na presença da deputada federal Carla Zambelli (PL-SP), segundo acusou na CPMI, receberia pagamentos para cumprir o plano.
No encontro, eles teriam combinado que o hacker iria fazer um código-fonte próprio em uma urna cedida pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para mostrar a população que era possível invadir o sistema eletrônico de votação usado pela Justiça Eleitoral brasileira. Delgatti teria de fazer um vídeo demonstrando as “fragilidades” das urnas
Ainda segundo o hacker, Bolsonaro teria oferecido indulto caso ele conseguisse comprovar a vulnerabilidade das urnas eletrônicas.
“A ideia ali era eu receber um indulto do presidente”, disse Delgatti ao responder uma pergunta da relatora da CPMI do 8 de Janeiro, senadora Eliziane Gama (PSD-MA). “Ele havia concedido indulto ao deputado (Daniel Silveira) e, como eu estava investigado pela Spoofing, impedido de acessar a internet e trabalhar, eu estava visando esse indulto, que foi oferecido no dia.”
Delgatti não apresentou provas contra Bolsonaro. Ele, contudo, afirmou que está à disposição das autoridades para realizar acareações com os citados em seu depoimento à CPMI.
Hacker fala em ações no Ministério da Defesa
Ainda em 2022, o hacker da “Vaza Jato” teria ido ao Ministério da Defesa ao menos cinco vezes — a mando do ex-presidente, sendo levado ao local pelo coronel Marcelo Câmara. Além disso, a autoria do relatório da pasta sobre as urnas teria sido inteiramente elaborado pelo hacker.
A ideia era que Delgatti “inspecionasse” o código-fonte das urnas eletrônicas brasileiras, mas não foi possível. No prédio da Defesa, o hacker teria conversado com o então ministro Paulo Sérgio Nogueira e com a equipe de tecnologia da informação da pasta.
“Eu faria um código-fonte da urna para as pessoas verem que é possível apertar um voto e aparecer outro”, explicou Delgatti. Depois, em um telefonema com Bolsonaro, o ex-presidente teria garantido que ainda poderia mandar prender um suposto “juiz” para proteger o hacker.
“Você precisa fazer isso pelo povo”, teria dito Bolsonaro, segundo o hacker. “Se não, o resultado vai ser a ruptura, igual a Venezuela.”
Na CPMI, Delgatti disse que, por ter sido o hacker da Lava Jato, “seria difícil a esquerda questionar a autoria” em relação ao seu trabalho de, no caso, mostrar, que as urnas eletrônicas do país seriam passíveis de violação. “Lá atrás eu teria assumido a ‘Vaza Jato’, e eles apoiaram”, afirmou. “Então a ideia seria um garoto da esquerda assumir esse grampo”.
Diante das acusações apresentadas por Delgatti, as defesas de Bolsonaro e Carla Zambelli se manifestaram. Advogado do ex-presidente, Fábio Wajngarten afirmou que o hacker mentiu. Ele ainda disse desconhecer um eventual encontro a sós dele com o ex-presidente da República.
Responsável por atender Carla, o advogado Daniel Bialski rechaçou as acusações feitas à CPMI do 8 de Janeiro. “A defesa novamente refuta e rechaça qualquer acusação de prática de condutas ilícitas ou imorais pela parlamentar.”
Nova prisão de Delgatti
Walter Delgatti Neto, o hacker da “Vaza Jato”, está preso em Araraquara (SP) desde 2 de agosto, dia em que a Polícia Federal cumpriu mandados de busca e apreensão contra a deputada federal Carla Zambelli (PL-SP). A corporação investiga a suposta atuação da parlamentar e do hacker na invasão dos sistemas do Conselho Nacional de Justiça e na inclusão de documentos e alvarás de soltura fraudulentos no Banco Nacional de Mandados de Prisão.
Conhecido pelo mundo dos crimes cibernéticos pelo apelido “Vermelho”, Delgatti Neto já havia sido preso em julho de 2019, no âmbito das investigações da Operação Spoofing, da Polícia Federal, na ocasião ele entrou na mira das autoridades por ter cometido crimes cibernéticos contra autoridades da Lava Jato. Ele chegou a invadir conversas privadas, feitas por meio do aplicativo de mensagens Telegram, do senador Sergio Moro (União-PR) e do ex-deputado Deltan Dallagnol (Podemos-PR) — ex-juiz federal e ex-chefe da força-tarefa da Operação Lava Jato em Curitiba, respectivamente.