Em mais uma tentativa de se aproximar dos evangélicos, com os quais encontra forte resistência, o governo Lula (PT) firmou parcerias em projetos de combate à fome com 27 agremiações religiosas, mas deixou de fora representantes de igrejas como a Universal do Reino de Deus e a Assembleia de Deus Vitória em Cristo.
Ao GLOBO, lideranças dessas denominações afirmaram não terem sido convidadas para o evento em que o acordo de coorperação foi assinado, segunda-feira, na sede de Associação Brasileira de Imprensa (ABI), no Rio, com a presença do ministro do Desenvolvimento Social, Wellington Dias. Procurado, o ministério informou detalhes sobre a iniciativa, mas não respondeu se essas igrejas haviam sido convidadas para a agenda. Após a publicação, a pasta afirmou que a parceria pode ser solicitada por todas as igrejas, independente da denominação ou linha religiosa.
No encontro, representantes de diferentes vertentes protestantes assinaram dois compromissos junto ao governo federal: o Plano Brasil Sem Fome e o Pacto pela Redução da Pobreza, iniciativas que têm como objetivo facilitar o acesso à renda, à alimentação, assim como promover ações conjuntas entre o Planalto e a sociedade civil para combater a desigualdade social.
O papel das entidades é identificar as pessoas mais vulneráveis e encaminhá-las para fazer inscrição no Cadastro Único (CadÚnico) para que possam fazer parte de programas sociais do governo, como o Minha Casa Minha Vida e o Bolsa Família.
Na lista de signatários à proposta de Wellington Dias, há representantes da Assembleia de Deus e das igrejas Batista e Presbiteriana — a grande maioria filiada a confederações neopentencostais que têm proximidade com grupo de religiosos que se autointitulam “evangélicos progressistas”. Principal representante desta categoria, o pastor Cesário Silva, filiado ao PT em Jundiaí, elogiou a iniciativa.
— Foi um gesto muito inteligente por parte do governo, um olhar necessário para as entidades evangélicas. Nós (evangélicos progressistas) estamos fazendo parte do governo que se mostra a cada dia mais sensível.
Mas no grupo que trabalhará junto com o governo também tem quem é de outro campo político. Os pastores Marcus Claudiano, da Convenção Interdenominacional de Ministros e Igrejas do Brasil e Exterior (Conimibe) e Tony Vandré, do Ministério Tabernáculo Church, declararam apoio ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) nas últimas eleições. Claudiano chegou a fazer duras críticas a Lula e ao Supremo Tribunal Federal (STF) nas redes sociais, referindo-se ao atual presidente como “condenado”.
Pastores não convidados
Líder da Assembleia de Deus dos Últimos Dias, o pastor Marcos Pereira foi o nome de maior peso que esteve na assinatura de acordos. Na relação de nomes, a reportagem não localizou a presença de igrejas evangélicas como a Assembleia de Deus Vitória em Cristo, comandada por Silas Malafaia, fortemente ligado ao bolsonarismo nos últimos anos, e o Ministério de Madureira, presidida pelo bispo Abner Ferreira. Em entrevista, os líderes afirmaram não terem sido convidados para o encontro.
A Comunidade Sara Nossa Terra, Universal do Reino de Deus e Batista da Lagoinha também não constam no evento. O fundador da Marcha Para Jesus, o apóstolo Estevam Hernandes Filho, disse não ter sido convidado. Ao GLOBO, o fundador da Sara Nossa Terra, bispo Robson Rodovalho, afirmou que gostaria de ter estado presente:
— Não soube de nada, sequer fomos avisados. Até o momento, não há aceno do governo ou qualquer intercomunicação construída. Seguimos abertos ao diálogo — disse o líder religioso.
O presidente da bancada evangélica no Congresso, Silas Câmara (Republicanos-AM), disse não ter visto qualquer movimentação sobre o tema, o que, em sua visão, mostra um afastamento entre a ala religiosa e o atual chefe do Executivo. O deputado federal Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), da Assembleia de Deus, afirmou que as agremiações escolhidas pelo governo não representam o segmento:
— Os rostos são desconhecidos, sem relevância nenhuma. Devem ser de pequenas igrejas, que não representam nada — diz Sóstenes.
O argumento foi respaldado por um dos maiores articuladores do atual presidente em sua campanha no ano passado, o pastor Paulo Marcelo Schallenberger, também da Assembleia de Deus.
— Acaba sendo um aceno aos progressistas. Essas entidades são pequenas, sem nenhum grande impacto.
Em 2022, o líder da Assembleia de Deus chegou a aparecer no horário eleitoral do então candidato na tentativa de atrair o segmento. No início do mandato, Schallenberger chegou a ser ventilado para assumir uma subsecretária voltada ao segmento, plano que não saiu do papel.
*Com informações OGLOBO