Menu

Corrupção volta a marcar governo Lula; entenda o impacto político da crise no INSS

WhatsApp
Facebook
Telegram
X
LinkedIn
Email

O esquema de fraude no INSS que desviou bilhões de reais dos benefícios de aposentados para contas de associações e sindicatos suspeitos volta a associar o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a um esquema de corrupção de grandes proporções, que começa a ser comparado ao investigado na Operação Lava Jato, segundo analistas e membros da oposição.

Um pedido de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) reuniu cerca de 70 assinaturas em menos de dois dias e parlamentares agora pressionam pela demissão e investigação do ministro da Previdência Social, Carlos Lupi, aliado do presidente Lula. A Controladoria-Geral da União (CGU) investiga irregularidades em repasses do INSS da ordem de pelo menos R$ 6,5 bilhões desde 2019.

O líder da oposição, deputado Luciano Zucco (PL-RS), disse que “o Brasil está diante de um dos episódios mais sórdidos e revoltantes da história recente da nossa Previdência Social”. Para Zucco, trata-se de um “assalto institucionalizado”.

“O que é ainda mais escandaloso é que essas associações possuem vínculos políticos escancarados com a esquerda brasileira, inclusive com o partido que hoje ocupa o Palácio do Planalto”, completou o líder da oposição. 

O governo tenta conter a crise com uma ação de propaganda encabeçada pelo ministro Sidônio Palmeira, da Secretaria de Comunicação (Secom). A estratégia é unificar o discurso e afirmar que o próprio governo investigou as denúncias e que a fraude não era no INSS, mas sim contra os aposentados e que será firmemente reprimida. Também há iniciativas de governistas para tentar culpar o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

Por outro lado, o governo não consegue explicar claramente porque demorou para agir. A atual gestão diz que os aposentados serão ressarcidos integralmente e que irá eleborar uma plano para fazer as devoluções, mas não detalhou como isso será feito.

“O governo anunciou que irá elaborar esse plano para proceder com as devoluções. A operação foi deflagrada ontem. Então é necessário, antes, ter a dimensão exata dos valores e todos os demais detalhes. É com base nisso que será elaborado o plano de devolução”, diz a nota da Secom enviada à reportagem.

Na avaliação de analistas ouvidos pela Gazeta do Povo, o episódio deve gerar impactos imediatos na popularidade de Lula. “É uma notícia com repercussão negativa, que imporá um novo desafio ao ministro da Secretaria de Comunicação”, aponta Raquel Alves, consultora em análise política da BMJ Consultores Associados.

Para o estrategista eleitoral Gilmar Arruda, o prognóstico sobre o impacto político do escândalo bilionário não é bom e deve manchar a reputação de mais uma gestão petista. “Nesta altura do campeonato, é muito ruim para o governo a explosão deste escândalo, porque terá que atuar mais uma vez na defensiva, desviando a atenção do público de outros assuntos que deveriam ser pautados pelo governo e que são do seu interesse”, disse Arruda.

A repercussão da operação da Polícia Federal fez com que o presidente Lula demitisse o presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, no início da noite de quarta-feira (24). A oposição, no entanto, pressiona também pela demissão do ministro da Previdência, Carlos Lupi, que foi o responsável pela indicação de Stefanutto ao cargo. 

Para o líder da oposição, deputado Luciano Zucco, Lupi já deveria ter sido demitido. “É impossível acreditar que tudo isso ocorria sem o conhecimento de seus superiores. Aliás, Lupi já deveria estar exonerado pelo bem da administração pública. Sua demissão deve ser para ontem”, disse o parlamentar gaúcho. 

A avaliação de analistas, no entanto, é de que a demissão não deve ocorrer. “É improvável. Ele [Lupi] é um aliado de Lula e presidente de um partido [PDT]”, afirmou Arruda. O estrategista não descarta um afastamento do ministro, mas entende que uma demissão, neste momento, seria como assumir a culpa pela fraude.

No mesmo sentido, a consultora em análise política Raquel Alves avalia que até o momento não foi verificado envolvimento direto do ministro com o esquema. Assim, para ela, a indicação de Stefanutto apenas enfraquece Lupi politicamente. 

Mas o desgaste de Lupi deve se agravar com a ofensiva da oposição. O deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) já afirmou que deve apresentar um requerimento de informações e também quer convocar o ministro da Previdência para comparecer à Comissão de Fiscalização da Câmara. “Ele terá que explicar como esse esquema se manteve por tanto tempo e quais medidas serão adotadas para responsabilizar os envolvidos”, disse o deputado mineiro. 

Dentro do próprio governo há discussões sobre a situação de Lupi. O ministro da Previdência foi responsável pela indicação de Alessandro Stefanutto, que acabou demitido da presidência do INSS no mesmo dia da operação da Polícia Federal sobre as fraudes contra os aposentados. 

Assessores do Planalto ouvidos pela reportagem afirmam que Lula cobrou ainda na manhã de quarta-feira (23) que Lupi demitisse imediatamente Stefanutto, mas houve resistência por parte do ministro. Com o impasse, a exoneração do presidente do INSS acabou sendo publicada no Diário Oficial por meio da Casa Civil, comandada por Rui Costa.

Ao chegar no ministério para trabalhar na manhã desta quinta (24), Lupi apenas disse a jornalistas que “não [vou comentar], é uma decisão do presidente da República tendo em vista do que foi apurado”. O episódio, segundo integrantes do governo, teria irritado Lula, pois essa é a segunda indicação do ministro da Previdência para o INSS que precisou ser demitido após suspeitas de irregularidades. 

Antes, Glauco Wamburg também foi exonerado da presidência do órgão, após denúncias de uso de passagens pagas pelo INSS em viagens para fins particulares. Apesar do desgaste, a avaliação da equipe de Lula é de que Lupi seguirá no governo, ao menos neste primeiro momento.

Essa não é a primeira vez que Carlos Lupi se envolve em escândalos. O político já foi ministro do Trabalho e Emprego durante os governos Lula (2007-2010) e no início do governo Dilma Rousseff.

Em 2009, Lupi foi flagrado usando um avião bancado por um empresário que tinha contratos com o seu ministério. Inicialmente, ele negou, mas depois houve a divulgação de fotos e registros que mostraram que ele de fato viajou na aeronave.  

Já em 2011, ele acabou envolvido em irregularidades relacionadas ao repasse de recursos para ONGs que firmavam convênios com a pasta para projetos de qualificação profissional. Algumas dessas ONGs eram ligadas a políticos do PDT. As investigações mostraram que havia um esquema de cobrança de 5% a 15% sobre os valores dos convênios.

Na época, a Controladoria-Geral da União (CGU) fez uma apuração que mostrou que havia irregularidades em convênios de pelo menos R$ 20 milhões. Apesar dos fatos, Lupi não chegou a ser investigado, já que não houve comprovação de que ele teria recebido propina diretamente. No entanto, os indícios de má gestão e ambiente propício a irregularidades causaram desgaste político e fizeram com que o caso culminasse em sua saída do ministério.

De acordo com o analista político e diretor de operações do Ranking dos Políticos, Luan Sperandio, a instalação de uma CPI pode se tornar um instrumento estratégico para a oposião. Mais do que a apuração, a comissão teria potencial para se transformar em um poderoso palco político, capaz de amplificar o desgaste do governo Lula e gerar consequências de grande impacto ao longo deste ano.

“A crise já resultou na saída do presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, mas agora pressiona também o ministro da Previdência, Carlos Lupi, que ainda não apresentou explicações satisfatórias à sociedade sobre responsabilidades e reparações”, afirmou.

O deputado Coronel Chrisóstomo (PL-RO) apresentou um pedido de criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar os desvios que, em menos de dois dias, alcançou 70 assinaturas. São necessários 171 apoiamentos para que o pedido possa ser levado ao presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB).

Para o deputado Rodrigo Valadares (União-SE), o Congresso precisa agir diante das denúncias de irregularidades. “Isso é corrupção institucionalizada. O Congresso precisa agir. As investigações direcionam para um esquema nível Lava-Jato — com o agravante de roubar o dinheiro dos idosos e aposentados”, apontou o parlamentar.

Deputados governistas, por sua vez, têm focado em afirmar que as fraudes tiveram início na gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), e que Lula é o responsável pelo governo que descobriu o esquema. “Quem era o presidente da República [em 2019, quando o esquema teve início]? Em 2023, Lula é eleito e coloca Vinícius de Carvalho como ministro da CGU, começa uma investigação sigilosa e aciona a PF, que desbaratou o esquema”, disse o líder o PT na Câmara, Lindbergh Farias (RJ), em discurso na tribuna.

O discurso do petista está alinhado com a estratégia desenhada pelo ministro Sidônio Palmeira, da Secretaria de Comunicação (Secom): investir no discurso de que o próprio governo investigou as denúncias e que a fraude não era no INSS, mas sim contra os aposentados e que será firmemente reprimida.

Vice-líder da oposição identificou “quadrilha do INSS” em 2024
O vice-líder da oposição, deputado Rodrigo Valadares (União-SE), disse que acompanha desde o ano passado suspeitas dessas fraudes. Em 2024, enviou um Requerimento de Informação que ajudou a desbaratar o que chamou de “quadrilha do INSS”.

No documento, ele cobrava providências do Ministério da Previdência sobre descontos indevidos em aposentadorias e, logo após, o ⁠Ministério da Previdência encaminhou a denúncia para a CGU. “Enquanto o cidadão comum espera meses por um benefício, o governo esquerdista some com bilhões. O Congresso precisa agir. O Brasil exige respostas”.

Para o deputado federal Messias Donato (PL-ES), a operação expos falhas graves na escolha de aliados e repete vícios do atual governo, no qual “interesses políticos se sobrepõem à ética e à boa gestão pública”.

O deputado Ubiratan Sanderson (PL-RS) avalia que a fraude se revela enquanto aposentados passam por necessidades. Ele lembra que aliados “enriquecem às custas do sofrimento alheio”. Sanderson exigirá, também no Congresso, uma investigação rigorosa e punição aos envolvidos, “porque toda punição para ladrões do dinheiro público é pouco”.

Governo cria grupo para tratar da crise do INSS, mas não explica como será devolução 
Após a repercussão das fraudes, a Advocacia-Geral da União (AGU) criou nesta quarta-feira (23) um grupo especial para buscar a recuperação do dinheiro descontado irregularmente dos aposentados e pensionistas do INSS. De acordo com o órgão, o grupo será formado por oito advogados públicos que vão atuar para propor medidas judiciais e administrativas para obter a reparação dos valores descontados e os danos causados contra o INSS.

“O Estado brasileiro, os aposentados e pensionistas foram lesados por esse esquema. Por isso, também vamos buscar a responsabilização das entidades que promoveram os descontos ilegais e recuperar cada centavo desviado”, disse o advogado-geral da União, Jorge Messias. 

A AGU, no entanto, não esclareceu como será feita a devolução dos valores descontados indevidamente. A Gazeta do Povo procurou o órgão, mas não houve retorno até o fechamento da matéria. 

No âmbito da Controladoria-Geral da União (CGU), houve a orientação para que os acordos de cooperação com os sindicatos e associações fossem suspensos, fazendo com que os valores deixem de ser descontados.

“A suspensão vai viabilizar em primeiro lugar que os recursos que iriam para as associações em maio já sejam retidos. Na próxima folha [de pagamento], [os valores] serão restituídos aos aposentados”, disse o ministro da CGU Vinicius de Carvalho. 

Em seu site, o INSS tem orientado aposentados e pensionistas a identificar possíveis descontos irregulares. Também orienta que o ressarcimento deve ser pedido por meio de um 0800 que aparece ao lado do nome da entidade no contracheque. Mais uma vez, não há informações precisas sobre a devolução, de fato. No site do INSS, uma nota aponta apenas que “em breve mais informações serão repassadas a fim de orientar os beneficiários sobre tais procedimentos”.

Leia mais em: https://www.gazetadopovo.com.br/republica/corrupcao-volta-a-marcar-governo-lula-entenda-o-impacto-politico-da-crise-no-inss/
Copyright © 2025, Gazeta do Povo. Todos os direitos reservados.