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Caso MC Poze mostra indignação seletiva da esquerda com “discurso de ódio”

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Esquerdistas que condenam retórica da direita em rede social passam pano para letras e condutas de funkeiro preso

A mesma esquerda que condena o “discurso de ódio da direita” nas redes sociais saiu em defesa da “cultura de favela” – como veremos adiante – de Marlon Brendon Coelho Couto, o MC Poze do Rodo, alvo de mandado de prisão temporária cumprido em 29 de maio, em investigação de envolvimento com o tráfico de drogas e de apologia ao crime.

Este último tipo penal está previsto no artigo 287 da Lei 2.848 de 7 de dezembro de 1940:

“Fazer, publicamente, apologia de fato criminoso ou de autor de crime. Pena – detenção, de três a seis meses, ou multa.”

MC Poze tem ligação com o Comando Vermelho?

O próprio MC Poze registrou ter ligação com a facção criminosa Comando Vermelho ao preencher o prontuário da Secretaria de Estado de Administração Penitenciária, marcando a opção “CV” no campo de “ideologia declarada”. Ainda de acordo com a Seap, ele afirmou “não ter problemas em conviver com a facção”.

Com a declaração, MC Poze foi levado para a Penitenciária Serrano Neves, conhecida como Bangu 3, no Complexo de Gericinó, uma das unidades prisionais onde ficam membros do CV, já que as cadeias do Rio de Janeiro são divididas entre facções para evitar conflitos entre os integrantes de cada uma.

defesa do funkeiro alegou que “essa prática, todavia, em nenhuma hipótese, traz ou poderia trazer qualquer grau de certeza sobre afiliações, associações ou qualquer vínculo do gênero”, pois “alguém que teme ser confundido ou tido como participante de determinada denominação via de regra é orientado a dirigir-se à mesma para evitar tumulto, sendo medida de segurança para si e para outros”

A influenciadora Viviane Nogueira, esposa de MC Poze, também alegou, nas redes sociais, que “ele é cria de uma comunidade, não tem culpa de o sistema ser dividido. Vocês, sendo cria de uma comunidade, escolheriam o quê?”

As alegações poderiam até fazer sentido para alguém que fosse apenas “cria de” – ou seja, nascido ou criado em – “uma comunidade” dominada pelo CV, como a Vila Kennedy (“VK”), em Bangu, na Zona Oeste do Rio, mas não para o autor e cantor de versos de pertencimento e exaltação de uma facção que sabidamente pratica crimes de extorsão, roubo, sequestro, tortura e assassinato:

– “Desde menor sou Comando, nós é relíquia”;

– “Nós é Comando Vermelhão de natureza”;

– “Nós vamo voltar pra casa e botar a bala pra comer / Retomar o que é nosso e gritar: É o CV!”;

– “Respeita o CV / Que só tem bandido brabo, só menor de guerra / Que bota pra foder / Nós é terror dos Terceiro, ADA e dos meleca”.

Quais são as letras de MC Poze na mira da Polícia?

A defesa de MC Poze do Rodo ainda protocolou em 31 de maio um pedido de habeas corpus na Justiça do Rio, alegando “perseguição à arte periférica”.

Os versos do funkeiro, porém, não se limitam a expressar, descrever, narrar, fantasiar, satirizar, transformar em crônica ou refletir sobre a realidade em torno.

Eles exaltam não só bandidos adultos e atos criminosos do CV, mas também menores de idade recrutados pela facção (os “menor”) e o arsenal de guerra das “tropas” do território, ameaçando com tiros de armas de fogo os membros (“três cu”“alemão”) de facções rivais, como Amigos dos Amigos (ADA) e Terceiro Comando Puro (TCP), além de milicianos (“meleca”) e policiais (“cana”).

1.

Umas das letras elogia os “menor” como soldados “bom de guerra”, destaca a precisão de seus disparos, e cita modelos de fuzil, como AK, 62 e G23, e pistola, como Glock, dizendo expressamente a rivais e policiais, respectivamente, que quem “entrar” no proclamado território do CV “leva” tiro e, se “brotar, a bala vai comer”:

“Oi, na VK os menor te acerta

Só soldado bom de guerra

Que te mira e não te erra

Só AKzão na favela

Com vários pentão reserva

Aonde entrar, cês leva

É bala nos três cu, é bala nos três cu

De 62 é só papum e os alemão aqui nem tenta

De Glock e de radin, fumando um baseadin

Destrava o G3zão que se piar, nós quebra

Respeita o CV
Que só tem bandido brabo, só menor de guerra
Que bota pra fuder
Nós é terror dos Terceiro, ADA e dos meleca

Fala que a tropa é Comando Vermelho
Se piar aqui na VK, vocês vai ver
Só soldado preparado, os menor descontrolado
Se os cana brotar, a bala vai comer”.

2.

Outra letra ameaçadora cita tropas prontas para a guerra em localidades da Cidade de Deus (“CDD”), como Karatê, 13 e 15; e o plano de retomar comunidades perdidas para os rivais, como o Rodo, em Santa Cruz, e o Bateau Mouche (ou Batô), em Jacarepaguá:

“Oi, que a tropa tá na pista

Geral com fuzil na mão

Se tentar no Karatê, vai tomar só rajadão

Se pisar no 15 você vai ficar fodido

Que é só os pitbull de raça

Brabo na troca de tiro

Nós tem Glock, tem AK, 62 com mira laser

Terror dos alemão, é os moleque da 13

Nós vamo voltar pra casa

botar a bala pra comer

Retomar o que é nosso

e gritar: É o CV!

Na CDD só tem bandido faixa preta

Tentaram vir pegar o homem e a bala voou

Nós é Comando Vermelhão de natureza

A meta é voltar pro Rodo e voltar pro Batô”.

3.

Outra letra também expressa ódio contra membros das facções ADA e TCP, além de manifestar força bélica com menção a fuzis, inclusive do modelo ParaFAL:

“Os TCPuta tá peidando pro bloco dos cria

Nós odeia ADA e TCP

Desde menor sou Comando, nós é relíquia

Trem bala dos manos

Com os fuzil tudo na pista, ah, ah, ah

Tropa do General com vários ParaFAL

Tá 2, tá 2”.

As gírias “tá 2”“tudo 2” e “faz o 2” são referências no mundo do crime ao CV, já que a denominação tem somente duas iniciais, além de o número 2 e a letra V serem feitos na mão com o mesmo sinal de dedos – indicador e médio – erguidos.

O que mostram os vídeos de MC Poze?

No palco, como registra um vídeo de show, MC Poze grita “Faz o 2, porra!”, conclamando a multidão presente a fazer o símbolo do CV, em enaltecimento à facção.

Entre os demais vídeos reunidos pela Polícia Civil, um deles mostra o funkeiro ostentando um fuzil; em outro, ele aparece atirando para o alto; em outro, ele dança com uma arma na cintura; e, em vários outros, “tropas” de homens do CV dançam com fuzis empunhados para cima durante um show de MC Poze na Cidade de Deus.

A indignação seletiva da esquerda

As postagens da líder da bancada do PSOL na Câmara, deputada federal Talíria Petrone (RJ), ilustram as diferentes condutas da esquerda em relação a discursos de “ódio” da direita e do funkeiro preso.

“Precisamos enfrentar com firmeza o discurso de ódio da extrema-direita e regulamentar as plataformas, com responsabilização das big techs”, escreveu Talíria em 4 de maio no X, relacionando ao direitismo a ameaça de bomba no show da cantora Lady Gaga, em Copacabana, apontada pela Polícia Federal.

No dia 12, Talíria protocolou um projeto de lei para proibir o uso de aeronaves como plataforma de disparo de armas de fogo, recurso eventualmente usado em operações policiais.

No dia 29, a socialista começou a coletar assinatura para criação de uma CPI que apure a existência de milícias ideológicas, redes de extermínio com motivações políticas, articulações de incitação ao ódio em ambientes digitais e possíveis conexões com agentes públicos e privados que possam alimentar atividades violentas, antidemocráticas e discriminatórias em diferentes regiões do país.

No mesmo dia 29, no entanto, a suposta desarmamentista Talíria publicou o seguinte no X:

Prender o MC Poze é mais um capítulo da criminalização da cultura de favela. O Estado abandona esses territórios, nega direitos e ainda persegue quem canta a realidade. Ao invés de perseguir fazedores de cultura, a polícia deveria investigar e responsabilizar quem financia o crime, inclusive a milícia. Funk não é crime. MC não é bandido. Basta de repressão aos nossos artistas!

A reação às narrativas da esquerda

Pedro Duarte, vereador no Rio pelo Partido Novo, rebateu no X as narrativas de esquerda que buscam camuflar nas categorias coletivas e genéricas de favelado, funkeiro e MC – as quais, obviamente, abrigam milhões de indivíduos não criminosos – os elementos específicos e comprometedores das condutas individuais de MC Poze:

“Quando Poze do Rodo canta ‘na VK os menor te acerta, só soldado bom de guerra. Que te mira e não te erra. Só AKzão na favela, com vários pentão reserva. Aonde entrar, cês leva’, ele não está cantando sobre a realidade da favela, muito menos narrando o dia a dia de quem mora lá.

Os moradores de comunidades do Rio de Janeiro não querem ter um ‘AKzão’, muito menos ‘pentão reserva’. São reféns desses bandidos, muitas das vezes protegidos por supostos defensores do ‘Estado Democrático de Direito’.

Existe Estado Democrático de Direito na favela onde ‘se entrar cês leva’?

‘Só soldado preparado, os menor descontrolado. Se os cana brotar, a bala vai comer’ não diz respeito às dificuldades que um morador da favela tem de se locomover pela cidade, ou de ter um emprego formal.

Estamos lidando com propaganda, pura e simplesmente.

Não vamos conseguir, enquanto sociedade, enfrentar grupos armados que controlam a vida de 3,7 milhões de cariocas, se tivermos dificuldade de chamar o que esses ‘artistas’ fazem pelo nome: apologia.

Estamos falando de uma máquina de recrutamento para o crime.

De letras enaltecendo assassinos de policiais, escancarando quais comunidades que eles querem tomar e glorificando diversas modalidades de crimes.

Funciona como uma verdadeira máquina de propaganda das facções, conquistando corações e movimentando milhões de reais, dinheiro esse que tem origem pra lá de suspeita.

Um exemplo claro da linha que tem de ser traçada é o que ocorreu na última segunda-feira [19], na Cidade de Deus. Mataram o policial da Core [Coordenadoria de Recursos Especiais, tropa de elite da Polícia Civil] José Antônio Lourenço.

Sabe o que MC Poze tem a dizer sobre isso? ‘Na CDD só tem bandido faixa preta. Tentaram vir pegar o homem e a bala voou. (…) Nós vamo voltar pra casa e botar a bala pra comer. (…) É o C.V!’ Isso é arte? Qual o argumento para dizer que esse trecho é arte?

O primeiro passo para perdermos a guerra, não nos iludamos quanto a isso, estamos numa guerra, é normalizar o absurdo e permitir que nossa sociedade continue sendo envenenada com essa propaganda vil, assassina e que pisa em todos os valores da nossa sociedade.

Chega. Temos de traçar uma linha entre a civilização e a barbárie. E nessa luta, Poze escolheu o seu lado.”

O problema da ‘narcocultura’

O verbo criminalizar, usado estrategicamente ao longo da última década para dar a políticos acusados de corrupção ares de vítima de perseguição política, também é usado para dar a indivíduos ligados a facções criminosas ares de vítima de perseguição policial, preconceito social e racismo, a despeito de seus elos e condutas individuais.

O objetivo dessa estratégia é comover as autoridades responsáveis pelo caso, arregimentando apoio nas camadas da população que se identificam com alguma característica que tenham em comum com os alvos, para que se sintam atingidas por tabela e saiam em sua defesa, gerando maior pressão sobre aquelas autoridades.

No entanto, assim como quem criminaliza a política, muitas vezes, são políticos que cometem crimes como corrupção, lavagem de dinheiro e peculato, quem “criminaliza a cultura da favela”, muitas vezes, são indivíduos que, diferentemente dos moradores cumpridores da lei, cometem crimes na favela e/ou fazem propaganda criminosa do cometimento e dos autores de crimes, criando e entoando hinos e gritos de guerra que os glorificam, e ajudando assim no recrutamento de menores de idade para a facção.

Facções como o CV dominaram favelas do país em razão da omissão e da cumplicidade históricas do Estado, mas nenhuma delas, enquanto a apologia for um tipo penal, serve de argumento para eximir de responsabilidade os fazedores da cultura do crime (ou, mais especificamente, da chamada “narcocultura”), nem para condenar autoridades do Estado por correrem atrás do tempo perdido no combate ao Estado paralelo, que impõe suas próprias leis antidemocráticas, impedindo, inclusive, a liberdade de ir e vir.

A ideologia declarada de esquerda vem corrompendo a moralidade comum ao colocar todos os moradores de favela no mesmo balaio de propagandistas de assassinos, sequestradores, extorsionistas, torturadores e ladrões, quando não destes que, em vez de buscar um emprego dentro da lei, como fazem milhões de pessoas de baixa renda sob seu jugo, escolhem o atalho do mundo do tráfico para conquistar rapidamente poder armado e dinheiro sujo, mesmo que reduzam a própria expectativa de vida.

Pela lei, não existe liberdade de defender publicamente um crime ou elogiar um criminoso, tratando ações ilegais como se fossem aceitáveis ou dignas de admiração. 

Apologia dá cadeia e, no mínimo, merece repúdio – seja ela de golpe de Estado, seja de assassinato dos “cana”.

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