A busca pelo indigenista e funcionário da Funai Bruno Pereira e pelo jornalista britânico Dom Phillips tem confirmado as piores suspeitas sobre o desaparecimento da dupla, que navegava no dia 5 de junho pelo Vale do Javari, na Amazônia, mas não chegou ao destino. De acordo com a família de Dom e diplomatas britânicos, os corpos dos dois foram achados mortos na floresta. A Polícia Federal (PF) desmentiu a informação, mas as autoridades descobriram documentos, roupas e objetos pessoais perto da casa do principal suspeito pelo desaparecimento, que continua preso.
Diante da repercussão internacional, o governo federal mobilizou Marinha, Exército, Força Nacional, Polícia Federal e Funai na busca. O presidente Jair Bolsonaro chegou a citá-la no discurso que fez na Cúpula das Américas. Infelizmente, os fatos não o eximem da responsabilidade por ter amplificado os conflitos numa região convulsionada por disputa de terras, desmatamento, garimpo e pesca ilegais. O aumento na devastação da floresta neste governo está comprovado por todos os levantamentos científicos.
Na campanha eleitoral, Bolsonaro defendia intervir no Ibama e no ICMBio para acabar com o que chamou de “indústria de multas”, tida como ameaça aos “empreendedores” — os que desmatam para extrair madeira ilegal, depois queimam a floresta para transformá-la em pasto e envenenam os rios com o mercúrio usado em garimpos.
No Planalto, Bolsonaro contou com a ajuda inestimável do então ministro Ricardo Salles, para desmantelar as estruturas de fiscalização e punição de madeireiros e garimpeiros. Só em 2020 houve 41 casos de afastamento e aposentadorias de servidores de órgãos ambientais, de acordo com a Controladoria-Geral da União (CGU). Houve recorde de processos administrativos disciplinares instaurados para pressionar a fiscalização: até setembro, 123 tramitavam no Ibama, maior número em 20 anos.
Pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) constataram queda de 93% nas multas quitadas nos dois primeiros anos de gestão Bolsonaro, na comparação com a média anterior. Isso se reflete na impunidade que fez da Amazônia terreno acolhedor ao crime organizado. Ante a leniência do Estado, facções criminosas passaram a operar na região — onde funciona intensa rota de tráfico — como se estivessem numa favela carioca.
Apesar de Bolsonaro tentar negar a devastação, os satélites continuaram a registrá-la. No primeiro trimestre, a Amazônia perdeu 941 km2 de cobertura vegetal, batendo o recorde de 797 km2 nos primeiros três meses de 2020. Para ter uma ideia da conivência do governo com o crime, basta lembrar que a PF fez, no final de 2020, uma apreensão de 43.700 toras, a maior da História. Salles, ainda ministro, saiu em defesa dos responsáveis, entrou em choque com o superintendente da PF no Amazonas, e o desfecho do caso foi o inaceitável afastamento dele do cargo.
Cientistas afirmam que o desmatamento se aproxima do ponto a partir do qual a floresta não conseguirá mais se regenerar e temem a savanização da Amazônia. Bolsonaro é atacado dentro e fora do Brasil. Sobre Bruno e Dom, afirmou que provavelmente “fizeram alguma maldade a eles”. Pudera. Com a omissão do Estado, o animal mais perigoso na Amazônia e em seus rios hoje são os criminosos. Eis mais uma sequela da gestão antiambiental do governo.
*Com informações metrópoles