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Na França, Lula discute agenda do clima e recebe título de “doutor”

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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) desembarca na França nesta quarta-feira (4) para uma série de agendas ao lado do presidente francês, Emmanuel Macron. A visita, que seguirá até domingo (9), inclui a entrega de um título de “doutor” para o petista, debates envolvendo a agenda climática e a guerra em Gaza, e ainda discussões em torno do impasse sobre o acordo comercial da União Europeia (UE) com o Mercosul. 

A expectativa da delegação brasileira é de que Lula e Macron assinem cerca de 20 atos bilaterais, incluindo acordos de cooperação nas áreas de vacinas, de segurança pública, de educação e de ciência e tecnologia. Essa será primeira visita de Estado de um presidente brasileiro à França em 13 anos – a última foi feita por Dilma Rousseff, em 2012. 

“Certamente vamos discutir a guerra da Rússia e da Ucrânia, certamente vamos discutir o massacre do Exército de Israel na Faixa de Gaza, certamente vamos discutir o acordo União Europeia-Mercosul, certamente vamos discutir coisas na área da defesa, porque temos uma parceria na área do submarino nuclear”, disse Lula nesta terça-feira em Brasília. 

O primeiro compromisso, no entanto, será em uma cerimônia organizada pela Universidade de Paris 8, onde o petista irá receber o título de Doutor Honoris Causa. O título, criado em 1918, homenageia personalidades que contribuíram para as ciências, artes e sociedade. 

Segundo Annick Allaigre, presidente da instituição francesa, o prêmio ao presidente brasileiro é resultado de sua “determinação e capacidade” para reunir uma frente ampla que “salvou a democracia brasileira de outra vitória da extrema-direita”. A instituição possui uma forte e histórica ligação com a esquerda francesa. 

Fundada em 1969, a Paris 8 foi criada como uma “universidade experimental” após os eventos de maio de 1968, um período de intensos protestos estudantis e greves operárias na França. Em 2003, Marilena Chauí, professora emérita de filosofia da USP, também recebeu o título. Chauí é apoiadora histórica de Lula.

Membro da oposição ao governo Lula, o deputado Maurício Marcon (Podemos-RS) criticou o fato de o petista fazer mais uma viagem e, dessa vez, em meio à crise do IOF – o governo anunciou aumento de impostos em maio, mas houve reação no Congresso e a gestão estuda alternativas para a questão. “Enquanto ele [Lula] aumenta impostos para o povo, segue viajando a passeio. Com popularidade no chão, sabe que o tour pago com o dinheiro público logo vai acabar”, afirmou o parlamentar.

Sem apoio dos EUA, Lula depende da França para acordo na COP-30 

Com a decisão do presidente Donald Trump de retirar os Estados Unidos do Acordo de Paris, integrantes do governo brasileiro admitem que o sucesso da Conferência do Clima (COP-30), que será realizada em novembro, em Belém (PA), depende da União Europeia e da China. Em aceno ao Brasil, a Presidência francesa indicou que Macron “está especialmente comprometido” em tornar o evento em um “sucesso” e com os compromissos de cada Estado para reduzir suas emissões de gases de efeito estufa. 

A expectativa da diplomacia brasileira é de que haja uma declaração conjunta entre os dois países ao fim da visita de Lula. “Lula terá vários encontros com Emmanuel Macron, nos quais ele discutirá aspectos relevantes do relacionamento bilateral e temas da agenda internacional de importância dos dois países, como a necessidade de reforma da governança global, a defesa do multilateralismo, o combate ao extremismo e a preparação para a COP30”, explicou o embaixador Flávio Goldman, diretor do Departamento de Europa do Ministério das Relações Exteriores, em conversa com a imprensa. 

Apontado como contraditório no discurso ambientalista de Lula, a possibilidade de exploração de petróleo na Foz do Amazonas pela Petrobras foi alvo de questionamentos por parte da imprensa francesa nesta semana. Ao jornal Le Monde, o presidente petista afirmou que o “Brasil não renunciará a exploração para seu desenvolvimento”. 

Segundo Lula, a Petrobras é reconhecida por seus conhecimentos em exploração em águas profundas e nunca sofreu um incidente grave. “A perfuração ocorrerá a 500 quilômetros do Delta do Amazonas e não haverá problemas. E se houvesse o menor risco, eu seria o primeiro a me opor a tal projeto”, afirmou. 

Impasse sobre acordo comercial marca relação de Lula e Macron 

Apesar do alinhamento na agenda ambiental, a resistência da França ao acordo comercial da União Europeia com o Mercosul é o ponto crítico na relação entre Lula e Macron. O avanço das negociações para colocar o tratado em vigor é tema prioritário da política externa do petista, mas encontra uma clara objeção por parte do governo francês.  

O acordo foi assinado no final do ano passado, mas ainda precisa ser ratificado pelo Parlamento Europeu e os legislativos de cada país de ambos os blocos. Quando a finalização das negociações foi anunciada durante encontro do Mercosul em Montevidéu, em dezembro de 2024, o governo da França se manifestou e classificou a versão aprovada do pacto como “inaceitável”. 

A resistência de Macron é vista como uma forma de protecionismo à indústria agrícola e pecuarista da França, que teme a concorrência de produtos sul-americanos, especialmente da carne bovina. O discurso do presidente francês é reforçado por grupos ambientalistas, que veem no acordo uma ameaça à sustentabilidade e aos padrões europeus. 

“O tema [do acordo comercial] será tratado nos encontros entre os dois presidentes. Nesse novo contexto geopolítico, pretendemos explorar essa possível condição favorável”, disse o diplomata Goldman em relação à “guerra comercial” com as tarifas de Trump aos demais países.  

Lula deve levar ao presidente da França ainda suas críticas sobre a nova lei antidesmatamento europeia, que deve entrar em vigor no final deste ano. A legislação determina que um grupo de sete commodities, entre elas carne bovina e soja, tenham sua entrada no bloco vedada se vierem de áreas desmatadas após 31 de dezembro de 2020. 

Oficialmente, o bloco alega que a restrição é uma medida para que os consumidores europeus não financiem de alguma forma o desmatamento de áreas de floresta a partir do consumo de produtos oriundos dessas regiões. O governo brasileiro, no entanto, teme que a medida possa afetar as exportações do país ao bloco que, em 2024, foi o segundo maior comprador de produtos brasileiros, totalizando US$ 48,23 bilhões. 

“Estas novas diretrizes dificultam o acesso ao mercado europeu de produtos brasileiros, da América Latina e de outras origens, incluindo a Ásia, ao invés de apoiar uma transição justa e sustentável. Incentivos positivos são mais eficazes na promoção da proteção ambiental, compensando e remunerando aqueles que prestam serviços ambientais”, informou o Ministério da Agricultura por meio de nota. 

Em abril, Lula sancionou a chamada Lei da Reciprocidade, que autoriza o Brasil a adotar medidas de retaliação comercial contra países que impuserem sanções unilaterais ao país. Caso seja colocada em prática, a nova legislação dá base legal para que o governo brasileiro imponha tarifas adicionais, suspenda concessões comerciais ou até mesmo deixe de cumprir obrigações relacionadas à propriedade intelectual quando houver medidas hostis de outros governos. 

“Em um cenário global onde as nações estão cada vez mais adotando posturas protecionistas, a Lei da Reciprocidade oferece ao Brasil um instrumento essencial para se proteger em caso de medidas desproporcionais, sempre priorizando o diálogo e a diplomacia”, disse a senadora e ex-ministra da Agricultura Tereza Cristina (PP-MS), ao apresentar o parecer sobre a proposta no Senado. 

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