As alterações na MP (Medida Provisória) que afrouxaram as regras do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) foram sugeridas, principalmente, por deputados e senadores de esquerda. Eles apresentaram 65 emendas durante a tramitação do texto no Congresso. O relator Paulo Eduardo Martins (PL-PR) fechou o texto com as mudanças, em acordo com os congressistas. A principal alteração foi na frequência da revalidação das autorizações dos descontos feitos por entidades nas aposentadorias. Leia a íntegra da MP 871 de 2019 (PDF – 491 kB).
O governo do então presidente Jair Bolsonaro (PL) enviou ao Congresso a proposta com a determinação de que a autorização do desconto deveria ser revalidada anualmente. Contudo, o texto final estabeleceu que a revalidação deveria ser feita a cada 3 anos, a partir de 31 de dezembro de 2021. Eis a íntegra da Lei 13.846 de 18 de junho de 2019 (PDF – 733 kB).
Na comissão mista que analisou a MP, deputados e senadores apresentaram 578 emendas. Dessas, de acordo com levantamento do Poder360, 32 pediam algum tipo de alteração nessa frequência. Leia a íntegra das emendas apresentadas (PDF – 14 MB).
Dessas emendas:
- 16 sugeriam que a exigência de revalidação anual fosse retirada do texto;
- 14 sugeriam que a revalidação fosse feita a cada 5 anos;
- 2 sugeriam que a revalidação fosse feita a cada 3 anos.
As emendas foram apresentadas por 22 congressistas de esquerda. Leia quais as siglas dos deputados que propuseram as alterações:
- PT, do presidente Luiz Inácio Lula da Silva: 17;
- Solidariedade: 3;
- PC do B: 3;
- PSDB: 3;
- PSB: 2;
- MDB: 2;
- Republicanos: 2.
O senador Paulo Paim (PT-RS) e o deputado Zé Neto (PT-BA) foram 2 dos que propuseram o prazo de 5 anos. À época, disseram que haveria “inviabilidade operacional” de se fazer a revalidação anualmente.
“Haja vista a movimentação diária de autorizações feitas por todas as entidades que mantêm Acordo de Cooperação com o INSS. Assim, revalidar cada autorização anualmente torna o desconto da mensalidade social praticamente inviável”, diz o texto utilizado tanto pelo senador quanto pelo deputado para justificar suas emendas.
No 1º relatório apresentado, Martins mudou o prazo de 1 para 2 anos. “O prazo de 1 ano, no entanto, não é praticável, dadas as dificuldades práticas para a sua adoção, motivo pelo qual entendemos que deve ser de dois anos”, diz no parecer. Eis a íntegra (PDF – 854 kB).
Foi na complementação do voto, depois do acordo feito na comissão, que o congressista do PL propôs a mudança para 3 anos, com validade a partir de 31 de dezembro de 2021. Eis a íntegra (PDF – 433 kB).
APOSENTADORIAS RURAIS
Os congressistas também apresentaram emendas para alterar as regras da MP em relação às aposentadorias rurais.
Bolsonaro propôs à época que o cadastro dos aposentados rurais fosse feito por meio do Cadastro Nacional de Informações Sociais, em acordo de cooperação com o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e com outros órgãos da administração pública federal, estadual, distrital e municipal.
Esse cadastro deveria ser atualizado anualmente desde 30 de junho de 2020. Contudo, o Congresso mudou o texto para que a determinação de atualização anual só começasse a valer em 5 anos, ou seja, em 2024.
Além disso, a comprovação do exercício da atividade rural deveria ser feita desde 2020, mas o texto foi alterado para que isso só começasse a ser exigido em janeiro de 2023.
As propostas para que essas alterações fossem feitas partiram de 34 emendas. Dessas, 20 foram apresentadas por deputados do PT.
Eis os partidos e as respectivas quantidades de propostas apresentadas:
- PT: 20;
- PSB: 4;
- MDB: 3;
- PSDB: 2;
- Psol: 2;
- PC do B: 1;
- PDT: 1;
- PV: 1.
Quando o texto chegou ao plenário da Câmara, os deputados de esquerda tentaram travar a votação. A Casa era comandada por Rodrigo Maia.
Então líder do bloco formado por PP, MDB e PTB, Arthur Lira (PP-AL) foi o responsável por articular uma emenda aglutinativa que destravou a votação. Eis a íntegra (PDF – 197 kB).
Lira juntou as propostas dos deputados André Figueiredo (PDT-CE) e João Daniel (PT-SE). Foi essa emenda que estabeleceu o período de 5 anos para que a exigência de atualização anual do cadastro dos aposentados rurais começasse a valer.
Nela, também ficou definido que a comprovação do exercício da atividade rural deveria ser feita a partir de janeiro de 2023. João Daniel também tentou incluir a participação de sindicatos no cadastro, pois considerava se tratar da “instituição mais habilitada” para o objetivo. O que não avançou.
PT NEGA ATUAÇÃO
Em nota, a bancada do PT na Câmara diz que atuou contra a MP de Bolsonaro porque era um “mecanismo de suspensão sumária de beneficiários, uma forma de cassar direitos, não respeitando sequer o direito de ampla defesa e presunção de boa-fé”.
O texto assinado pelo líder do partido na Câmara, deputado Lindbergh Farias (PT-RJ), afirma que a medida “criava as condições para promover uma exclusão em massa” dos beneficiários. Diz também que o partido, que era oposição na época, “nunca atuou para relaxar prazos em descontos de mensalidades”.
“Nossa obstrução jamais foi para relaxar o combate a fraudes. É errado atribuir ao PT e às esquerdas algo nesse sentido. Quem mudou a lei para ampliar o prazo de validade das autorizações dos descontos de 1 para 3 anos foi exatamente o relator da base bolsonarista, deputado Paulo Eduardo Martins (PSC-PR), conforme seu parecer”, diz a nota.
Ocorre que, durante a discussão em torno da MP 871, de 2019, deputados da esquerda defenderam a aprovação de emendas que ampliavam o prazo de revalidação das autorizações dos descontos feitos por associações e sindicatos nas aposentadorias e pensões, como foi mostrado nesta reportagem.
Os discursos registrados na sessão de 29 de maio de 2019 também revelam que havia acordo entre os líderes de partidos para que as emendas fossem aprovadas. Normalmente, quando há acordo, o relator de um determinado projeto ou medida incorpora a emenda em seu parecer.
O PT diz que a responsabilidade pelas alterações é do governo Bolsonaro e seus aliados no Congresso na época da aprovação da medida.
Leia a íntegra da nota, que foi enviada inicialmente à colunista Malu Gaspar, do jornal “O Globo”:
“Esquerda não brigou por descontos de mensalidades no INSS
“As alterações legislativas ocorridas durante o governo Bolsonaro no tema dos descontos associativos no âmbito do INSS são de responsabilidade do ex-presidente e de seus aliados no Congresso
“A apuração de Malu Gaspar, publicada hoje (13/05) no portal do jornal O Globo, tem uma série de imprecisões.
“O centro da MP 871/19 não era o desconto de mensalidades de beneficiários do INSS, conforme dizia sua ementa.
“A matéria, de autoria do governo Bolsonaro, tinha como objetivo principal fazer um suposto “pente-fino” em irregularidades no INSS, BPC e Bolsa Família.
“Na verdade, a MP era um mecanismo de suspensão sumária de beneficiários, uma forma de cassar direitos, não respeitando sequer o direito de ampla defesa e presunção de boa-fé.
“Importante destacar que a grande maioria dos beneficiários é de pessoas de baixa escolaridade, com pouca inserção em novas tecnologias, o que dificultaria a manutenção de seus direitos. A MP criava as condições para promover uma exclusão em massa desses beneficiários. A principal luta do Partido dos Trabalhadores era para impedir a cassação de direitos.
“Além disso, também atuamos fortemente para impedir que a MP modificasse mecanismos de comprovação da atividade rural para a agricultura familiar. Nós adotamos, sim, uma obstrução e uma posição muito firme de crítica à MP nesse aspecto, o que poderia ter sido facilmente comprovado por meio da análise da tramitação da matéria e suas notas taquigráficas.
“O PT nunca atuou para relaxar prazos em descontos de mensalidades, como a matéria de Malu Gaspar. Nossa obstrução jamais foi para relaxar combate a fraudes. É errado atribuir ao PT e às esquerdas algo nesse sentido. Quem mudou a lei para ampliar o prazo de validade das autorizações dos descontos de 1 para 3 anos foi exatamente o relator da base bolsonarista, deputado Paulo Eduardo Martins (PSC-PR), conforme seu parecer.
“O tema dos descontos era colateral, não foi objeto de votação nominal nem de destaques naquela ocasião.
“Nós nos colocamos contra a MP por entender que ela estava sendo usada pelo governo Bolsonaro para uma atividade cruel: cassar sumariamente os direitos dos trabalhadores.
“Não há que se falar em guerra de versões. A verdade é uma só: as alterações legislativas ocorridas durante o governo Bolsonaro no tema dos descontos associativos no âmbito do INSS são de responsabilidade do ex-presidente e de seus aliados no Congresso.
“Brasília, 13 de maio de 2025
“Lindbergh Farias
“Líder da Bancada do PT na Câmara dos Deputados”
OPERAÇÃO
Em 2025, a Polícia Federal deflagrou a operação Sem Desconto, que investiga um esquema de descontos indevidos em aposentadorias e pensões do INSS por sindicatos e outras entidades.
Os descontos investigados eram realizados sem autorização do beneficiário e sem prestar, na prática, nenhum serviço. O total do desvio foi estimado em R$ 6,5 bilhões de 2019 a 2024.
O caso resultou na saída de Carlos Lupi (PDT) do Ministério da Previdência e de Alessandro Stefanutto da presidência do INSS.
A esquerda tenta jogar a culpa na gestão Bolsonaro, porque o esquema teria começado em 2019. Já a direita protocolou um pedido de criação de CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) para investigar a gestão de Lula e a relação com os sindicatos.
*Com informações Poder360