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O combate à pobreza com o novo modelo para o Amazonas

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Diante desse quadro adverso, há necessidade de uma nova matriz econômica para impulsionar o desenvolvimento e reduzir disparidades sociais.

O estado do Amazonas enfrenta uma perda significativa de importância econômica nos cenários regional e nacional nas últimas décadas. Esse declínio tem impactado diretamente a população, resultando no aumento da pobreza, da violência urbana e da desigualdade entre a capital, Manaus, e os 61 municípios do interior.

Para viabilizar as mudanças antes de tudo, é necessária, independente de ideologias partidárias, uma ação conjunta entre os Três Poderes, Ministério Público, classe política e sociedade civil. A coordenação desse movimento deve ser liderada pelo governo do estado, com o apoio da Assembleia Legislativa, do Ministério Público e do Judiciário. A preservação da floresta e a defesa dos povos indígenas são também prioridades, considerando as constantes ameaças decorrentes da extração ilegal de madeira e do garimpo.

Embora a Zona Franca e o Polo Industrial de Manaus sejam fundamentais para a economia do estado, sua atuação isolada é insuficiente para reverter o cenário de empobrecimento. Setores como petróleo, gás natural, mineração, fertilizantes, turismo e pesca são alternativas viáveis, pois independem dos incentivos tributários federais e podem descentralizar a economia, beneficiando os municípios do interior. É importante evoluir a legislação sobre incentivos estaduais, de modo a aumentar o valor agregado dentro do Amazonas e atrair novas atividades econômicas para diversas cidades ou localidades mais distantes.

Esse esforço precisa ser regido pelo governador do estado, mas com apoio das lideranças do Ministério Público, Poder Judiciário, Assembleia Legislativa, em razão da exigência das respectivas novas legislações. Trata-se de um projeto conjunto que exige a união de forças, desapego a vaidades ou medição de poder. Nunca foi tão necessário reunir o empenho de todos os que verdadeiramente amam a Amazônia e se preocupam com o futuro dos filhos daquela região grandiosa. É imprescindível que os líderes saibam traçar o caminho mais ajustado para o estado e a população que ele acolhe. Naturalmente todo brasileiro, se orgulha de um patrimônio tão gigantesco e deseja o melhor para aquela parte basilar do corpo territorial da nação. Não podemos esquecer que o planeta inteiro está sempre prestando atenção nesse ativo descomunal e cabe a nós todos mantê-lo, desenvolvê-lo e defendê-lo com abnegação.

Apesar de ser o 14º estado com maior arrecadação tributária do país, o Amazonas apresenta baixos índices de desenvolvimento humano, bem-estar e educação. Além disso, a população amazônica carrega a responsabilidade de preservar a maior floresta tropical do planeta sem receber a devida compensação financeira por isso

Dados do IBGE e IPEA mostram que, entre 1970 e 2002, o PIB do Amazonas cresceu expressivamente, passando de 0,80% para 2,62% do PIB nacional. No entanto, a partir de 2002, esse crescimento não se sustentou e, em 2024, a participação do estado caiu para apenas 1,50%, reduzindo em R$ 120 bilhões/ano os recursos que poderiam estar circulando na economia local. Esse retrocesso afeta principalmente os 61 municípios do interior, onde vivem cerca de 2 milhões de pessoas. Enquanto o PIB per capita de Manaus foi de R$ 55 mil/ano em 2024, o dos municípios do interior foi de apenas R$ 25 mil/ano. Isto é, o PIB per capita do interior correspondeu a pouco mais 40% do PIB per capita da capital. O que significa que foi 2,25 vezes menor no período.

A desigualdade econômica dentro do próprio estado é alarmante. Ao mesmo tempo que Manaus se beneficia dos incentivos da Zona Franca, os demais municípios não contam com uma atividade econômica capaz de garantir qualidade de vida para seus habitantes. A concessão de renúncia fiscal do ICMS, que chega a R$ 10 bilhões/ano, fortalece a principal atividade econômica da capital, o Polo Industrial de Manaus (PIM), que fabrica diversos produtos para todo o país, mas é apontada como um fator de exclusão para o restante daquela unidade federativa.

Apesar de ser o 14º estado com maior arrecadação tributária do país, o Amazonas apresenta baixos índices de desenvolvimento humano, bem-estar e educação. O enorme território estadual, de 1,57 milhão de km², abriga apenas 4,28 milhões de habitantes e um PIB de US$ 32 bilhões, com a baixa ocupação econômica da região. Além disso, a população amazônica carrega a responsabilidade de preservar a maior floresta tropical do planeta sem receber a devida compensação financeira por isso.

O crescimento da pobreza e das favelas tanto em Manaus quanto em cidades do interior é outro problema preocupante. Dados do IBGE indicam que 51% da população do estado vive na pobreza e 10,5% na extrema pobreza. Apenas9,1%dapopulaçãotêmrendimentosuperior R$ 2.200/mês. E aqueles com remuneração de R$ 3.300/mês estão entre os 10% mais ricos da população.

Estudos apontam que Manaus é a capital brasileira que mais cresceu em ocupações irregulares entre 1985 e 2022. O bairro Cidade de Deus, por exemplo, está entre as 10 maiores favelas do Brasil, com mais de 83 mil moradores e mais de 10,5 mil domicílios ocupados. De acordo com levantamento divulgado pelo Map Biomas, essa expansão corresponde a aproximadamente 10 mil campos de futebol. O fenômeno da favelização, além da capital, tem se espalhado fortemente pelo estado. Em algumas cidades o crescimento da pobreza chega até entre 60% e 75% da população.

Num estado que possui a 14ª maior receita tributária, entre os 26 estados e o Distrito Federal, possuir uma população tão vulnerável economicamente é paradoxal. Esses cidadãos lamentavelmente também estão hoje sujeitos ao controle de organizações criminosas e à violência nas cidades, além de apresentar baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e Índice de Retorno de Bem-Estar Social (IRBES),e ainda níveis de educação muito longe do desejado.

Uma condição que favorece o problema são os grandes vazios demográficos e econômicos. Por outro lado, esta pode ser também uma oportunidade de criação de uma nova fronteira de produtividade, como ocorreu em outros estados brasileiros. Para uma ideia mais nítida, na vastidão do território Amazônico (1.571.000 km²) caberiam 15 nações europeias, com uma população total de 284,6 milhões de pessoas e um PIB total de US$ 12,46 trilhões. Portanto, haveria neste território imaginário um contraste abissal com os atuais 4,28 milhões de habitantes do Amazonas e um PIB estadual de US$ 32 bilhões.

Nessa região há um contraponto complexo, porque a população amazonense vivencia a cobrança mundial da preservação da Floresta Amazônica, e os moradores locais, como ribeirinhos, caboclos e indígenas, não recebem devidamente o reconhecimento dos seus esforços que têm realizado e pouco se sabe. Para impedir o avanço da pobreza, o estado do Amazonas precisa de uma nova matriz econômica. É necessário realizar mais reflexões sobre a remuneração ao Brasil pela preservação dessa sua floresta tão importante para o Planeta Terra.

Um estudo do Banco Mundial estima que a não exploração dessa cobertura vegetal gigantesca gera uma renúncia econômica de US$ 317 bilhões/ano. Como o Brasil detém cerca de 60% da Amazônia, o valor correspondente seria de US$ 190 bilhões/ano, dos quais US$ 95 bilhões caberiam ao estado do Amazonas e ao país. Esse montante em boa parte poderia ser investido em um modelo econômico sustentável para a região.

Em breve um documento detalhado deve ser entregue ao Poder Executivo, reivindicando a implementação de medidas concretas para o desenvolvimento do Amazonas. A oportunidade de apresentar essa demanda internacionalmente virá ainda neste ano, em Belém (PA),durante a 30ª Conferência das Partes da ONU sobre Mudança do Clima (COP 30).

É essencial também a mobilização de toda sociedade civil brasileira. A população precisa cobrar compromissos dos futuros governantes que serão eleitos (governador, deputados federais e senadores) no ano que vem. A urgência da mudança exige menos palavras vazias e mais ações efetivas para garantir um futuro melhor para os amazonenses. A sociedade deve exigir isso. Aquele estado tão extraordinário merece e precisa de mais desenvolvimento e menos desigualdade. Como alertou o economista John Kenneth Galbraith: “Nada estabelece limites tão rígidos à liberdade de um cidadão quanto a absoluta falta de dinheiro”.

Samuel Hanan é engenheiro com especialização nas áreas de macroeconomia, administração de empresas e finanças; empresário, foi vice-governador do Amazonas (1999-2002). É autor dos livros “Brasil, um país à deriva” e “Caminhos para um país sem rumo”, “Brasil que País é este” e “Brasil Pós CF/88 – Fantástico e vergonhoso –”. Site: https://samuelhanan.com.br

*Com informações gazetadopovo

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