Ao ministrar uma aula magna de recepção aos calouros da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), no salão nobre do prédio histórico no Largo do São Francisco, nesta segunda-feira (24), o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e professor da Faculdade de Direito, Alexandre de Moraes, disse que os “algoritmos são direcionados ideologicamente para doutrinar as pessoas”.
Na ocasião, Moraes fazia uma digressão sobre as “raízes” do que considera ser um problema nas redes sociais, que é a possibilidade de qualquer pessoa, sem diploma universitário, falar o que quiser e influenciar outras pessoas.
Em sua fala, o ministro também voltou a defender a regulação das redes sociais e repetiu ataques às Big Techs e ao que costuma chamar de “extrema-direita”. Segundo Moraes, as redes sociais foram instrumentalizadas por “grupos econômicos fascistas para corroer a democracia por dentro”.
Para ilustrar o seu ponto de vista, Moraes disse que o “discurso de ódio” compartilhado nas redes sociais tem origem nas crises econômicas, quando, segundo o ministro, parte das populações do Brasil e de outros países começaram a buscar culpados para responsabilizá-los pela crise.
“Em um determinado momento a partir de crises econômicas mundiais somadas à concentração de renda, uma grande faixa [da população], principalmente, uma faixa que chamamos no Brasil de classe média, começou a se sentir incomodada […] E, a partir disso começou o discurso de ‘eu só estou nessa situação econômica porque tem muito estrangeiro, é o discurso europeu. É o fascismo, a extrema-direita se recuperando eleitoralmente. Ahh… só estou nessa situação porque tem muito brasileiro de outro estado vindo aqui para roubar meu emprego”, falou Moraes.
“Ahh… ‘por que não tem mais emprego? Porque as mulheres entraram no mercado de trabalho’. A misoginia voltou forte. [Esse tipo de discurso] pega principalmente homens brancos, héteros, em torno de 45 anos para frente […] Olha, para combater o mal é importante a gente conhecer as raízes desse mal. Esse sentimento, esse retorno ao discurso que antes se brincava que era o discurso do tio do churrasco, hoje é o discurso de 20% da Alemanha, de muito mais por cento do Brasil”, continuou.
Moraes diz que Big Techs “captaram” discurso de ódio para lucrar com as redes sociais
Moraes seguiu sua análise enfatizando que apesar de as Big Techs são serem as responsáveis pelo “sentimento [de ódio]” surgido a partir das crises econômicas, elas (as Big Techs) souberam “captar” esses sentimentos e transformá-los em “um mecanismo de doutrinação em massa” nas redes sociais.
“Elas [as Big Techs] já tinham expertise para isso no campo econômico. Simplesmente ampliaram o foco. Já tinha estudos do direcionamento dos algoritmos no campo econômico para fins de conseguir levar produtos às pessoas. A grande discussão no mundo é saber como funciona a utilização dos algoritmos nas redes sociais. Não são randômicos. Você manda uma mensagem a favor da democracia e uma determinada rede manda para 5 pessoas. Você manda uma mensagem xingando alguém, o algoritmo manda para 100 mil pessoas. É igual loteria? Não! Os algoritmos são direcionados ideologicamente para doutrinar as pessoas”, afirmou o ministro.
Ataques à democracia
Para Moraes, o movimento conjunto entre as Big Techs e políticos da “extrema-direita” é o responsável pelos “ataques à democracia” que, segundo o ministro, começou com “ataques à liberdade de imprensa” dos veículos tradicionais.
“O que esse novo populismo digital extremista fez? ‘Nós não podemos acabar com a mídia, vamos criar um canal paralelo de notícias falsas que tenha a mesma influência’. Hoje, o Zezinho da esquina, que é um influencer, solta uma notícia fraudulenta e os jornais têm de comentar essa notícia para dizer que é fraudulenta. Só de comentar, já deram credibilidade a ele. As pessoas não sabem mais em quem acreditar”, disse.
Moraes ainda disse que as eleições livres e periódicas também estão sob ataque. “É um arremedo de democracia quem faz eleição não livre porque já sabe quem vai ganhar”, pontuou o ministro.
“Ataques ao judiciário”
Por fim, Moraes disse que o movimento contra a democracia seguiu com ataques ao Judiciário.
De acordo com o ministro, primeiro tentaram modificar o número de ministros ou cooptar membros das Cortes superiores em outros países. Depois, partiu-se para o “confronto, como ocorreu no Brasil”.
Enquanto se preparava para subir ao púlpito para ministrar a aula, uma das integrantes da mesa que presidia o evento levantou-se com uma plaquinha onde estava escrito “sem anistia”. Os jovens da plateia aplaudiram e gritaram a frase que faz referência aos presos do 8 de janeiro.