No começo do ano passado, a esquerda questionou na Corte a constitucionalidade do artigo da Lei das Estatais que obriga políticos a obedecerem a uma quarentena de 36 meses antes de assumir cargos em empresas públicas.
Ricardo Lewandowski – naquela época, como hoje, um ministro de Lula – suspendeu a validade do artigo e com isso os cargos foram preenchidos da maneira que interessava ao presidente.
Passaram-se os meses.
Validando o inválido
Nesta quarta-feira, 8, o plenário do STF finalmente passou a abordar o mérito da questão. Quando a sessão foi interrompida, o placar estava em 5 a 2, no sentido de confirmar que a quarentena é constitucional. Falta apenas um voto para que se forme a maioria, o que deve acontecer na tarde desta quinta, 9.
Curiosamente, contudo, o STF deve validar as nomeações feitas por Lula quando os efeitos da lei estavam suspensos.
O ministro Luis Roberto Barroso ofereceu um argumento complementar para isso: como já se passou bastante tempo (por culpa do STF, diga-se), forçar a demissão dos nomeados poderia pôr em risco “a continuidade dos serviços públicos”.
Aposta premiada
Contemos a história de outra maneira.
Existe uma lei em vigor que desagrada o governo da hora. A patota do governo consegue uma liminar que interrompe provisoriamente os efeitos da tal lei incômoda.
Com essa decisão temporária em mãos, o governo faz o que quer, mesmo sabendo que pode ser obrigado a voltar atrás se o plenário do tribunal validar a lei; trata-se de uma aposta.
O governo perde a aposta, porque o plenário do tribunal conclui que a lei é perfeitamente constitucional. Mas o governo também ganha a aposta, porque não é forçado a demitir a companheirada. Burlou a lei e mesmo assim foi premiado.
Casuísmo
Pode até haver reviravolta no futuro, porque nada é sólido no STF. Neste momento, porém, vê-se a criação de um lapso temporal que valida o inválido e só vai beneficiar o governo Lula 3.
Governos futuros não poderão nomear com a mesma liberdade usufruída pelo petista, porque a corte reconheceu que a quarentena que já estava em vigor no ano passado é perfeitamente constitucional.
O nome disso é casuísmo.
Se quiser, também pode chamar de favorecimento político.
Ruim para o serviço público
O argumento não para de pé, mas vamos aceitar por um momento a ideia de que é preciso garantir que não haja prejuízo “à continuidade dos serviços públicos”.
Nesse caso, o STF poderia estabelecer um prazo para que as nomeações ilegais sejam desfeitas e novas pessoas contratadas. Digamos, 15 dias.
A meu ver, já seria uma baita concessão.
Mas não: parece que a corte vai mesmo chancelar a ilegalidade.
O problema dessa história não é só o que o PT sai ganhando com sua aposta descarada. O serviço público também sai perdendo.
Porque uma regra que afasta políticos por algum tempo de cargos em estatais não serve apenas para evitar o aparelhamento das ditas cujas e possíveis maracutaias; ela também incentiva a contratação de pessoas com currículo sólido e experiência de gestão.
É inacreditável.